Pelo segundo ano consecutivo, os alunos da Turma de Acolhimento
participaram na 2º edição do concurso Kamishibai Plurilingue subordinado à
frase de Georges Perec “Eu lembro-me..”, tendo-lhe sido atribuído o 1º prémio
na sua categoria, distinção que muito nos deve orgulhar por relevar o trabalho
destes alunos.
Kamishibai (teatro de papel) é uma ferramenta pedagógica que já faz parte
do trabalho da aprendizagem da escrita colaborativa na Turma de Acolhimento caracterizada
pela diversidade pluricultural e plurilinguistica. A descoberta de uma nova
forma de produção da escrita narrativa, à qual se associa a ilustração e
posterior apresentação no butai (palco), destaca as aprendizagens no domínio da
língua e a apropriação dos valores humanistas essenciais numa aprendizagem
holística.
Com o
kamishibai todos os alunos, independentemente do seu ano de escolaridade e
proficiência linguística, participam em igualdade com os seus pares salientando
as suas competências gráficas e sociais. A escrita, pela complexidade que a
carateriza, é geralmente o domínio em que se denota uma maior dificuldade no
processo de aprendizagem dos alunos. Tornar este domínio mais apelativo e
motivador e mudar o paradigma é uma das valências do kamishibai. Os textos não
ficam confinados aos dossiers e cadernos, ganham outra dinâmica e transbordam
para novos suportes e materiais que, partilhados com a comunidade educativa,
despertam e valorizam a comunicação noutras línguas e culturas. A planificação
da escrita enforma o processo deste domínio, as tarefas de revisão e
melhoramento do texto contam com a opinião e participação de todos, enriquecendo
a narrativa e trazendo outros pontos de vista para a história. Perante a escuta
de uma história numa língua diferente da da escola, os ouvintes reagem
positivamente e querem aprender a dizer aquelas palavras numa outra língua. Os
falantes de língua não materna, cientes da sua pronúncia especial, deixam de
manifestar o sentimento de vergonha que inicialmente os remete a um mutismo
constrangedor. Crescem em português e fazem crescer na aprendizagem da sua
língua pela curiosidade suscitada e vontade de esbaterem a barreira
linguística.
A
organização e distribuição de tarefas é assumida pelos alunos de forma a
destacar as suas áreas fortes seja na conceção das imagens gráficas, que salientem
a ideia principal da narrativa, seja na incorporação de falas nas suas línguas
maternas. Esta dinâmica torna a utilização do Kamishibai um projeto único,
inédito e especial. A escrita e posterior leitura de apresentação são momentos
de encantamento e de rendição ao bom que é a valorização do outro. A cocriação
desenvolve os aspetos linguísticos, comunicativos e cognitivos projetando outra
visão do mundo da escrita.
Este ano
concorremos com o trabalho intitulado “Sodade”, porque saudade é algo que os alunos da turma de acolhimento sentem dos
países, das pessoas e das vivências que deixaram do outro lado da vida e que os
une na sua individualidade. Estes alunos, que constituem uma franja
significativa do agrupamento de escolas da Damaia, ingressam no sistema
educativo com reduzidos conhecimentos linguísticos de português. São orientados
na cultura da nova sociedade que os acolhe e na aprendizagem do português, mas
tendo presente a valorização das suas línguas e culturas. São alunos que, na
sua maioria, superam os desafios e as barreiras que uma nova língua lhes
coloca, com esforço empenho, algumas lágrimas e muitos sorrisos pelo meio. Cresce-se
em português e nos afetos. Os elos que criam entre si e as pontes ancoradas nas
suas experiências de vida fazem emergir a cumplicidade da jornada. A
participação no projeto Kamishibai desde a primeira edição ressalvou a
importância das suas línguas e culturas em consonância com os saberes que
portam e partilham com os falantes nativos.
Este ano, com a chegada de um aluno da Guiné Conacri e após o
conhecimento de si consolidava-se o sentimento comum: as lembranças de um tempo
recente e a saudade incrustada na pele, que deu o mote à escrita desta história
destinada à 2ª edição kamishibai plurilingue. Incorporaram-se as suas vivências
com os amigos e a sua bicicleta, e as memórias e relatos de cada um corporizou
a escrita. O entusiasmo, já conquistado na primeira participação do concurso
Kamishibai, aliou os novos alunos na cumplicidade e na partilha. O esforço,
neste ano atípico, deu um outro colorido ao trabalho, gravado à distância, e
que permitirá a apresentação on line na cerimónia de dia 20 de julho, centrada
na Universidade de Aveiro, organizada pelo Laboratório Aberto para a
Aprendizagem de Línguas Estrangeiras (LALE), do Centro de Investigação em
Didática e Tecnologia na Formação de Formadores (CIDTFF) da UA, parceiro da
rede Internacional Kamilala (kamilala.org).
Belisanda
Tafoi
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